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Início de um sonho |
Fizemos muitos planos para ter nossa casinha, chegamos a cogitar a antecipação do casamento civil para conseguir uma inscrição num plano habitacional da Cohab.
Mas chegou o dia de nosso casamento e não tínhamos ainda nosso tão sonhado cantinho e tivemos que morar um tempo com meus pais. Tempo difícil, mas também de aprendizado, de exercitação da paciência, da tolerância, do respeito às diferenças.
Mas já em 1987 conseguimos comprar nosso terreno. Estávamos no auge da "estabilidade" econômica trazida pelo fracassado Plano Cruzado, do governo Sarney, quando surgiu a oportunidade. Animados pela "derrubada" da inflação, a Imobiliária Boldrini e loteador do Jardim São Jorge, James Leroy Waughan, decidiram vender os terrenos que restavam no bairro.
Vi a propaganda no jornal O Liberal, onde trabalhava, e corri à imobiliária. Verifiquei no mapa os terrenos que ainda estavam disponíveis e fui junto com a Marilda conhecer o local. Foi uma decepção enorme.
"É nesse lugar feio que vamos morar?" Foi a pergunta que a Marilda me fez. Ponderei que poderíamos vender o terreno depois e comprar em outro local, que não podíamos perder a oportunidade.
Afinal, não dispúnhamos de dinheiro suficiente para adquirir um terreno e esse era parcelado em 60 meses. Eram 30 mil cruzados de entrada, 10 prestações de 5 mil, 10 mil, 15 mil, 20 mil, 25 mil e 30 mil. Fiz e refiz os cálculos e decidimos arriscar. Pagaríamos ao final dos 60 meses 1 milhão e 50 mil cruzados por um terreno que valia 200 mil à vista.
Meu pai achou um absurdo, mas não tínhamos mesmo outra saída. A dificuldade maior seria quando a prestação mudasse de 5 para 10 mil, o que representaria 100% de aumento. Mas apostei na volta da inflação e deu certo. Ela voltou mesmo, atingindo a casa dos 80% ao mês. Os salários eram reajustados mensalmente pra tentar inutilmente acompanhar a inflação galopante.
Mas se por um lado os salários perdiam a corrida contra a inflação, o valor das prestações do terreno logo se tornou irrisório. Veio o Plano Bresser, ainda no governo Sarney, e com ele a tablita, que aplicava uma deflação sobre os contratos com valores pré-fixados. Cada mês o valor diminuía e acabei quitando mais de 30 prestações de uma só vez.
A maior dificuldade, na verdade, nem ocorreu quando a prestação mudou de 5 para 10 mil. Foi, sim, na primeira prestação. Para dar a entrada tínhamos juntado todas as economias, sacamos PIS, Fundo de Garantia e chegamos aos 30 mil. Mas no dia que venceu a primeira prestação não tínhamos o valor para pagar.
Meu salário era de pouco mais de 6 mil no O Liberal e não tinha sobrado nada. Cheguei no jornal meio acabrunhado naquele dia. Sentei-me num banco que havia na recepção, sem coragem de subir as escadarias para a redação. E fiquei ali alguns minutos pensando em como resolver o problema. O jeito seria pagar as prestações sempre com um mês de atraso.
Absorto em meus pensamentos vi quando o Ari, gerente do jornal, se aproximou e me chamou à sua sala. Entrei, sentei-me à sua frente, ele abriu a gaveta, tirou um maço de notas e me entregou explicando: "o jornal teve um bom desempenho neste mês e o Jessyr (Bianco) decidiu dar um abono aos funcionários".
Exultante de alegria agradeci e saí da sala. Ao contar o dinheiro a alegria foi maior ainda: 5 mil cruzados, o valor exato da prestação. Me veio à mente naquele momento a recomendação do Evangelho: "buscai primeiro o Reino de Deus e tudo o mais vos será dado por acréscimo".
(Publicado originalmente no Facebook em 15/05/2012)
(Publicado originalmente no Facebook em 15/05/2012)
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