Por volta das seis da manhã minha mãe me acordava. Meio sonolento eu me trocava, tomava um café preto e seguia para o INPS, na esquina da Rua Irmãos Chrisóstomo de Oliveira com a avenida Rui Barbosa, onde dezenas de pessoas já aguardavam na fila.
Era assim toda vez que ela ou meu pai precisavam de uma consulta médica. Era assim a saúde pública em Penápolis e em todo o Brasil até o início dos anos 80: a fila do INPS. Na verdade era o Inamps (Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social).
Só tinha direito de enfrentar essa fila quem tinha essa carteirinha de beneficiário, fosse segurado ou dependente. A condição para ser segurado do Inamps era ter carteira assinada ou contribuir como autônomo. Quem estivesse desempregado ou na informalidade não tinha direito à assistência médica e hospitalar.
A minha carteirinha nunca usei, mas enfrentei muita fila para pegar uma guia de consulta para minha mãe. Às vezes para o dr. Jorge, outras vezes para o dr. Mário Ramos. Ambos cardiologistas. A preferência dela era o dr. Jorge, mas dependendo da posição na fila nem sempre conseguíamos a guia, pois havia uma cota para cada médico.
Muita gente passava a noite na fila para conseguir a consulta com o médico da preferência ou para ganhar um trocado guardando o lugar para quem não queria levantar tão cedo. Essa situação só começou a mudar em Penápolis a partir de 1983, quando dr. João Carlos D'Elia assumiu a Prefeitura e iniciou a implantação dos postinhos (PAS) nos bairros. Foi a primeira política de universalização do atendimento à saúde em Penápolis, que serviu de modelo para a criação do SUS, a partir da constituição de 1988.
Sempre me lembro da fila do INPS quando vejo críticas ao SUS. O sistema tem falhas, é fato, mas o considero o melhor sistema público de saúde do mundo. Nesses 20 e poucos anos avançou muito.
Quando você compra alimentos num supermercado, come num restaurante ou numa lanchonete e se sente seguro com as condições de higiene, o SUS está presente. Quando você leva seu filho ao postinho para ser vacinado (e olha que sou contra a vacinação), é o SUS presente. Quando você recebe a visita de agentes comunitários de saúde em sua casa, orientando sobre a prevenção da dengue, o SUS também se faz presente. Quando um parente seu vai a Barretos se tratar de câncer... Ou ao Hospital das Clínicas passar por uma cirurgia... Ou ainda buscar um medicamento da cesta básica de remédios, realizar exames numa clínica de especialidades, fazer fisioterapia...
Em todos esses procedimentos, nunca imaginados pelos frequentadores da fila do INPS, está presente o SUS. Que precisa ser melhorado, aperfeiçoado e, sobretudo, superar a visão médico-hospitalar, passando a trabalhar a educação para a saúde através da difusão de hábitos saudáveis entre a população.
Mas não dá pra negar: o SUS, com seus defeitos e virtudes, com suas qualidades e deficiências, atende a todos os brasileiros que o procuram, mesmo aqueles que o criticam e aqueles que poderiam dele prescindir, mas recorrem à Justiça para que o Sistema lhes pague tratamentos de ponta, caríssimos.
(Publicado originalmente no Facebook em 03/01/12)
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